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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

As festas de Aniversário de Belinha


As Festas de Aniversário de Belinha



Percorrendo a NET, encontrei um site interessante sobre as festas de aniversário[1]lembrei-me imediatamente das festas de Belinha, minha amiga desde a minha velha infância. Envelhecendo juntos, acompanhei de certa forma todos os seus aniversários e com a minha velha mania de comparar tudo o que conheço, percebi que há uma relação entre a evolução do conhecimento e os atos que praticamos. No contexto das mudanças de comportamento sociais que vimos verificando, na medida do progresso da humanidade, as festas de aniversário também mudaram. E muito!

Belinha nasceu na década de 40 do século passado. Por essa época não se esperava viver mais do que sessenta anos. Hoje já se fala em expectativa de vida acima dos oitenta. Como Belinha adorava comemorar aniversários, por vezes imaginava como seriam suas comemorações quando tivesse mais de setenta anos. De lá para cá (da década de 40, do século passado), muito mudou na forma como Belinha passou a prever suas festas de aniversário.


Belinha não sabia que a origem de Aniversário – palavra que significa “tudo aquilo que volta todos os anos”, tem origem latina, nem que era um costume no Egito antigo para qualquer cidadão e na Grécia apenas para homenagear deuses e reis. Não sabia nada da origem dos costumes, mas gostava do ambiente da festa desde a emoção dos preparativos até receber os presentes e comemorar com farta mesa cheia. Depois odiava ter que ajudar a limpar tudo e verificar que alguns presentes ela detestava desde o abrir do pacote ou do embrulhinho, tudo muito decorado, mas com pouco conteúdo. Nessas ocasiões ficava com a sensação de que o doador do presente não gostava dela.  Talvez até a odiasse, e assim, no ano seguinte já nem o convidaria, mas antes, gozava da sua vingança particular: Ia a seu aniversário, e dava-lhe um presente pior do que ele lhe tinha dado. Para saber que presente seria mais odiado, pedia a amigas que sondassem junto da “vítima”. Foi perdendo amigos, fazendo outros, mas as festas de aniversário foram mudando ao longo dos anos, exatamente porque temos a mania de comparar o que damos com o que nos dão, o que fazemos com o que nos fazem. È uma medida seletiva para separar os “amigos” dos “inimigos” dos ‘indiferentes. Estes quase nunca eram convidados.  

Belinha viu muita gente que se dizia comunista cantar o “parabéns pra você” sem saberem que esta música tinha sido criada pelas irmãs americanas Mildred e Patrícia Smith Hill em 1874 para as crianças de uma escola. Também não sabiam que em 1923, o título da canção fora alterado para “happy birthday to you” – parabéns para você- depois de ser editada em livro. Muito menos ainda sabiam que a música recebeu uma versão brasileira: A rádio Tupi promoveu um concurso em 1942, para que as pessoas escolhessem uma letra que se encaixasse na melodia original. A letra escolhida, entre cerca de cinco mil participantes, foi a de Bertha Celeste Homem de Mello.

Belinha tem memórias inesquecíveis de muitos de seus aniversários, na forma como evoluiu este tipo de festa ao longo das décadas de sua vida. Nos primeiros anos gostava dos aniversários pela festa e pelos presentes. Depois pela convivência, pelos presentes e pela festa. Mais tarde, preferia a festa e os presentes, depois apenas os presentes e hoje fez aniversário na cama do hospital (está internada) comemorando com um pequeno bolo individual, com uma velinha maior nele espetada, e uma enfermeira, eu e dois parentes cantando “parabéns pra você”... Nenhum dos outros seus amigos convidados foi ao hospital comemorar o seu aniversário. Lembrou-se então de um dia em que viu uma amiga (surdamente não se suportavam) enfiar o dedo “fura-bolos” no seu bolo de aniversário pensando que ninguém estava vendo. Evidentemente essa amiga nunca ficou sabendo que “aquele” pedaço do bolo que ganhara de Belinha no aniversário de 1958, levara uma dedada do “pai de todos” que previamente ela passara em sua bunda.

Em 1973 diziam que havia uma crise de petróleo, e os presentes foram uma desgraça de tão fracos e ruins. O problema é que belinha em 1972 já tinha dado presentes caros e bons a seus amigos, e voltaria a fazê-lo em 1974, depois de passada a crise. Quando chegou a moda de convidar para aniversário em casa de festas, cada convidado pagando o seu consumo, Belinha aderiu, mas a assistência ficou selecionada entre os que arranjaram uma boa desculpa para não ir, e os que não tinham como se desculpar. Foi assim durante alguns anos. Belinha jura que em algum dia da próxima década, as festas de aniversário estarão fadadas a ser comemoradas por raras famílias apenas para as crianças. Muitas aniversariantes se encheram de tantos panos de prato, outros de tantos frascos de Bozzano com dois enes. Um fenômeno que fez muitos homens detestarem loção para barba porque se viram obrigados a suportar o mesmo cheiro anos a fio porque era isso que recebiam em todos os dias 24 de dezembro e nos dias de seus aniversários, não importa de que ano.

Belinha prevê também o fim das festas de Natal, porque muitos já acham que pagam uma parcela muito alta, na divisão das despesas, para festa tão “pobre”. Festas de Natal percorreram o mesmo caminho das festas de aniversário, quase sempre passado na casa do Patriarca. Embora atualmente se passe também na casa das Matriarcas – quando se comemora – os presentes são sempre questionáveis, achando uns que deram muito e outros que receberam pouco. Peru passa voando muitas 

 vezes cheirando a chester apressado, e o resto é decoração com muitas frutas. Muitos já não acreditam em Jesus ou têm muitas dúvidas sobre religião, família e amizades. Outros questionam que não há bebidas alcoólicas e uma grande parte virou vegetariana. Todos dizem que largaram o cigarro mas fumam lá fora ou saem apressados para satisfazer o vício que agora tem que viver escondido por ter sido escorraçado dos hábitos sociais. 

A maioria está ocupada na Internet, filhos jogando videogames, maridos e mulheres ora com dor de cabeça ora com sono. A solidão é a grande onda do século XXI. Melhor do que passar por cenas como aquela de 2001, quando a família toda quase saiu na tapa porque as comadres se zangaram e as verdades se descobriram, mas nem assim sobrou comida na mesa... Natal igual àquele, nunca mais.

Rui Rodrigues   

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

A Queda dos três prédios no Rio de Janeiro


A queda dos três prédios


Assistimos a algo inusitado no filme que nos passam todos os dias na cidade do Rio de Janeiro, um filme construído com as imagens dos acontecimentos que despertam interesse da população e são amplamente reportados em programas de TV, jornais, revistas, conforme nos dizem ter entendido os “fatos”.

Nada disso precisava ter acontecido, assim como outros desastres de construção do passado, como o do elevado Paulo de Frontin, na década de 70, por exemplo. Falta algo em nossos órgãos relacionados com a normalização e fiscalização da engenharia como um todo e de sua execução. O sistema é aberto e permissivo. Leis existem. Exigências e Normas, também. Exigem-se plantas, memoriais de cálculo, tudo aparentando um controle e uma segurança confiáveis, mas não se fiscaliza. Mas temos o CREA e o CONFEA.

O CREA, por exemplo, exige a filiação dos engenheiros para que possam exercer a profissão. Os engenheiros registram-se, pagam anuidade. Para que uma obra, mesmo de reforma, possa ser executada, é necessário que a empresa construtora contribua para o CREA.

Mas contribuir para quê?

O que proporciona em troca o CREA aos seus afiliados, às empresas de engenharia?  Consultoria técnica? Verificação dos projetos? Aprovação dos projetos ? Laudos técnicos? Fiscalização da execução? Apoio legal aos seus membros? Ou um prédio onde se pode tomar cafezinho e bater um papo na Avenida Rio Branco, como é o caso da 5ª Região?

Parece que nada disto é proporcionado pelo CREA nem pelo CONFEA, que continuam arrecadando contribuições sem sabermos para que sirvam essas arrecadações. Pior do que isto, é que não existe nenhuma outra entidade que verifique os projetos e sua execução, que cuide da engenharia nacional como os cidadãos merecem, principalmente aqueles que vivem em morros que podem desabar; que passam sobre bueiros que podem explodir; que passam debaixo de viadutos que caem sobre veículos e pessoas, de prédios que desabam porque foram construídos com areia do mar.

Não existe a engenharia preventiva no Brasil. As Prefeituras têm atribuições sobre a engenharia e a arquitetura que não lhes cabe.

A corrupção é muito grande e todos sabem disto. Jogar a culpa na lei é idiotice. Se a lei não cuida, votaremos novas leis, ou alteraremos as leis que não atendem a cidadania.

Quem pagará os prejuízos morais e materiais dos que perderam a vida, se feriram, ou perderam o seu patrimônio, o seu emprego, porque três prédios caíram do dia para a noite, por erros técnicos acumulados?

Quem aprovou os projetos? Quem fiscalizou?

Rui Rodrigues

Teoria do caos

Uma borboleta voando pode mudar sua vida?
Todos os grandes matemáticos, usando a Teoria do Caos, dizem que uma borboleta batendo as asas no Brasil pode provocar um tufão na Indonésia. É que todas as coisas no universo estão, de certa forma, ligadas, e o bater de asas de uma borboleta pode provocar uma reação em cadeia que termina gerando um tufão.
Se isso pode acontecer, então porque é que não pode fechar sua empresa? Ou mudar sua vida? Já parou para pensar nisso? São tantas variáveis acontecendo na vida que a maioria das pessoas simplesmente desiste de tentar escolher seu destino.
Chuck Yeager foi o primeiro humano a quebrar a barreira do som voando no seu Bell Aviation X-1. Na época muitas pessoas diziam que a ‘barreira’ era impenetrável, e que ele e seu avião desintegrariam assim que atingisse a velocidade Mach 1 (a velocidade do som).
É claro que a barreira não era impenetrável coisa nenhuma. Era apenas um mito. Anos mais tarde, na sua biografia, Yeager escreveu que “a verdadeira barreira não estava no céu, mas na nossa cabeça – no conhecimento e experiência dos vôos supersônicos”.
Da mesma forma, vemos todos os dias pessoas voando baixo, vagarosamente, porque acham que existe alguma ‘barreira’ para uma performance melhor. Uma barreira que os impede de crescer. E, geralmente, colocam a culpa em fatores externos.
Mas a sua vida não precisa ser assim. Você não precisa viver de susto em susto, de crise em crise, sempre apagando incêndios, sempre perguntando o que virá pela frente, sempre voando baixo.
Como assumir o controle, então?
Já faz algum tempo que sabemos que o futuro será diferente do passado. Mas insistimos em nos recusar a acreditar que nossa vida será diferente do que esperamos que ela seja. A maioria de nós ainda acredita que o futuro será uma continuação do presente, como uma estrada reta que se perde no horizonte.
De acordo com Alvin Toffler, é uma percepção linear, previsível, de que A leva a B que leva a C. Só que a prática mostra que o futuro não é uma continuidade do presente, mas sim uma série de descontinuidades. E o pior é que nossa educação, ao invés de ajudar a quebrar essas ‘barreiras’, na verdade acaba reforçando-as. As escolas foram desenhadas com a certeza de que todos os problemas do mundo já foram resolvidos, e que o professor conhece todas as respostas.
Então, a função do professor passa a ser a de apresentar os problemas aos alunos, e depois as respostas. Nos ensinam as perguntas e as respostas, mas não a pensar. Por isso a dificuldade quando as perguntas mudam.
Para agarrar o futuro você precisa largar o passado. A única forma de impedir que sua vida seja uma sucessão de descontinuidades é tendo uma estratégia de vida. Senão você é jogado de um lado para outro, de acordo com o vento ou a maré. Ou uma borboleta batendo as asas. E não consegue nunca ir de A para B ou C. Como diria Toffler, não precisamos que nos ensinem apenas como fazer alguma coisa, mas sim a imaginar o que é possível fazer.
É como quando o primeiro avião conseguiu voar. A partir desse momento mudou completamente o contexto do desenvolvimento da aviação. Cada avião que caía provava aos cínicos, de forma evidente, que era impossível fazer um avião voar. Mas quando ele finalmente voou, tudo mudou. As mesmas informações começaram a ser interpretadas de um modo diferente. As quedas passaram a ser vistas como evidências dos erros, de como as coisas não deveriam ser feitas. As pessoas simplesmente começaram a pensar de forma diferente.
A mesma coisa aconteceu com Chuck Yeager e a velocidade do som. As barreiras estavam apenas na cabeça – no conhecimento e na experiência. Bastou alguém dedicar-se a derrubar essas barreiras através de uma boa estratégia para provar que estavam erradas.
Se você quer quebrar suas próprias barreiras e voar alto, precisa de uma estratégia. Estratégia de vida começa com uma proposição diferente de valor, de missão pessoal.
É uma forma de definir um território onde você é de alguma forma único. Estratégia é fazer escolhas. Principalmente, escolher o que fazer diferente, e também o que não fazer. Por isso mesmo você é obrigado a escolher, já que não dá para ser ou fazer tudo.
Esse é outro ponto que deve ficar muito claro: para ter uma boa estratégia você tem que aprender a dizer não. Todos os dias aparecem nas nossas vidas novas propostas de negócios, muitas altamente tentadoras. Uma pessoa sem estratégia vai acabar distraindo-se ao perseguir negócios que parecem lucrativos, mas que na verdade não têm nada a ver com a estratégia a longo prazo, nem com sua missão de vida. Acabam sugando recursos, tempo e energia, desviando-se da sua missão, confundindo ainda mais sua vida.
As melhores estratégias sempre levam a um objetivo maior. Se não tiver um objetivo bem claro em mente, começará a tomar decisões que inevitavelmente diminuirão sua eficiência. A essência da estratégia é estabelecer limites. A pessoa sem estratégia está disposta a tentar qualquer coisa. Principalmente, copiar os outros. Você tem que fazer menos coisas, mas fazê-las muito melhor. Você tem que encontrar e desenvolver vantagens, e não apenas eliminar desvantagens. Criar diferenças, e não apenas copiar. Esse é o segredo!
Para terminar, a grande dúvida: vale a pena ter uma estratégia num mundo que muda constantemente? Ela não será uma camisa de força, uma corrente que produz rigidez e inflexibilidade?
Algumas pessoas podem pensar: “As coisas estão mudando rapidamente, então preciso mudar rapidamente também. Logo, não posso ter uma estratégia, porque ela me tornaria mais lento”.
Acontece que grandes conquistas só são alcançadas por pessoas com objetivos claros e estratégias definidas. Pessoas que não apenas imaginaram voar alto ou quebrar barreiras, mas também bolaram planos para chegar lá.
Por isso, Michael Porter defende justamente a idéia contrária: uma boa estratégia, na verdade, acelera o processo, porque permite que você tome decisões de acordo com seus objetivos. Peguemos um exemplo com a tecnologia: não adianta comprar todas as bugigangas e novidades tecnológicas que aparecem se isso não tem um objetivo muito claro. Você não vai aumentar sua produtividade simplesmente porque tem mais aparelhos disponíveis. Você tem que saber para onde quer ir e, com base nisso, tomar as decisões.
Resumindo: ter uma estratégia é ser diferente. Você não é apenas mais uma pessoa – você está ali para trazer algo novo para o mundo, para mudar o mundo, para mudar para melhor a vida das outras pessoas. Uma vez que você tenha sua estratégia claramente definida, todas as perguntas serão fáceis de responder: ou ajudam você a alcançar seus objetivos, ou não. E finalmente você terá controle da sua vida.

By Raúl Candeloro, escritor e palestrante.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

O que existe para lá da vida...






O que existe para lá da vida...


Não sabemos. Temos pistas, mas não sabemos realmente. Cada religião acredita em algo diferente de umas para as outras. Vivemos especulando o que realmente existirá. Por isso não entrarei no mérito de sequer tentar explicar porque razão uma religião seria mais “certa” do que outra.

Tudo o que se tem lido é fruto de deduções que são influenciadas pelos conhecimentos da época em que foram deduzidas e pela idiossincrasia dos povos que as elaboraram. Esses “videntes” acreditavam ter condições para afirmar o que julgavam existir para além da vida. Em particular, embora se tenha notícia de descobertas de túmulos de milhões de anos atrás em que já se enterravam os mortos com flores e em posição fetal, virados de lado, como que denotando uma vida para além da morte, foi com os egípcios que se começou a delinear uma religião em que toda a nossa vida seria avaliada num além, julgada, e premiada ou castigada. Isso acontecia no tribunal do deus Osíris. São tantas as religiões, quantas as variáveis sobre uma pretensa vida após a morte.

Uma coisa é certa: as religiões, baseadas na esperança, proporcionaram uma estabilidade nos governos, uma facilidade política para governar. Podemos deter-nos na História Universal para vermos como Estado e religião sempre estiveram intimamente ligados, apoiando-se mutuamente. Em troca, as igrejas podem receber esmolas sem ter que pagar impostos ou declarar faturamento, e não são obrigadas a aplicar o dinheiro que recebem. Porém, com a evolução da democracia e o advento das mais modernas tecnologias, a importância das religiões no controle emocional das populações vem diminuindo. Assim, no passado as igrejas chegaram a dominar as populações sob governos teocráticos, depois passaram a eleger e a ungir os reis que diziam ser descendentes divinos, deuses terrenos, depois somente a indicar, e finalmente já não indicam ninguém para o governo. Pelo contrário, a Constituição Européia não contém uma única palavra referente a “deus” ou a “Deus”. A democracia encontrou um caminho mais fácil para conter, controlar, adestrar, dominar, encaminhar, dirigir, as suas populações, através de programas específicos que proporcionam um relativo “bem estar” das populações, em troca do pagamento de impostos e uma folgada liberdade de atuar em nome do povo. O que existe para lá da vida, perdeu a importância relativa que possuía no passado. A esmagadora maioria da população mundial nem pensa nisso por décadas a fio: Não sente a necessidade da “justiça” de haver um prêmio ou um castigo para além da vida. Está “confortável”...

A percepção de que algo existe para além da vida, é uma função decorrente da importância que nos damos a nós mesmos. Como somos “importantes”, “filhos de Deus”, não poderíamos aceitar que seria suficiente - para Deus - que tivéssemos a oportunidade de sentir e avaliar nossa existência. Precisávamos acreditar em algo mais importante que isso: uma segunda oportunidade de “viver”, mesmo sem sabermos como seria essa “vida”. Evidentemente, cada religião pensa de uma forma. Mas ter fé em algo, não significa que esse algo exista, ou sequer seja como pensamos. Em teoria, podemos, com certa benevolência, raciocinar sobre o assunto, não à luz das religiões, mas à luz de uma teoria que não tenha apenas a fé como ferramenta de entendimento, mas a lógica do que conhecemos. Não podemos raciocinar sobre o que desconhecemos, sem que usemos os nossos conhecimentos. É fato. É lógico.

A primeira linha de raciocínio nos coloca frente a frente com a necessidade da existência de outra vida. Não seria esta suficiente? Porque queremos ou mereceríamos uma nova vida? Como prêmio de nossa bondade, ou condescendência para com as nossas maldades praticadas? Evidentemente que nossa azáfama dos trabalhos diários e a necessidade premente de tomar soluções, nos têm “obrigado” a tomar atitudes que não foram “boas” para os que nos cercam ou para o meio que nos cerca. De certa forma todos nós pecamos contra o próximo de uma forma ou de outra. Uma segunda vida nos permitiria “consertar” o que fizemos de errado nesta. Não temos porém nenhuma indicação de que Deus  seja tão benevolente ou esteja minimamente disposto ou interessado nisso. Nem se Deus está interessado em “salvar” a humanidade, ou se espera que esta se salve pelos próprios méritos.

A segunda linha de pensamento é mais prática. Não importa se Deus nos daria uma nova oportunidade ou não. Importa apenas que acreditemos na possibilidade de existência de uma nova vida após a morte, e tentar descobrir como poderia ser. Muitos exemplos se podem buscar na farta literatura que existe a respeito. É imensa, antiga, e recente, sob o enfoque de qualquer filosofia ou religião. O mais lógico seria partirmos da pressuposição de que não exista apenas um paraíso, um inferno, mas muitos céus e muitos infernos, cada um de acordo com o que cada um de nós possa merecer. Para uns, paraíso pode ser um lugar onde 7 virgens o esperem, ou sete machos fogosos e jovens, também virgens para as mulheres que cheguem ao paraíso. Para outros, pode ser um lugar sobre as nuvens, tocando harpa o dia inteiro, tomando suco de maracujá e comendo algodão doce com doce de leite. Para outros, uma viagem eterna ao redor do universo. Para a maioria, um lugar de encontro com todos os membros da família de quem gostassem, com os demais no inferno. Para outros ainda, uma imensa praia com belas mulheres permissivas, deitados numa rede, tomando água de coco, sandálias de dedo, bermudas e uma prancha de surf, com um bom som ligado ouvindo Bach, Beethoven, ou um rap para os espíritos que vieram ao mundo mais recentemente. Maconha para uns, paz de espírito e diga não às drogas para outros. Paraísos devem ser segundo a vontade de cada um de nós, e não um paraíso comum, socialista, onde nos digam que o que é bom para um tem que ser bom para todos... Assim não seria paraíso e muitos viveriam contrariados como se estivessem no inferno.

Não sabemos em que paraíso Jesus estará sentado à direita de Deus, nem em que paraíso Deus estará, mas na forma como a humanidade parece caminhar, devem estar vazios os paraísos, cheios os infernos, com filas intermináveis para o banho quente diário de lava derretida. Se Deus se irritasse novamente com a humanidade como se irritou com Sodoma e Gomorra, certamente todas as mulheres se transformariam em estátua de sal, e Lot não teria para onde se mudar...

Rui Rodrigues

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

As asas dos anjos




“Anjo[1] (do latim ângelus e do grego ângelus, mensageiro), segundo a tradição judaico-cristã, é uma criatura celestial – que, na generalidade, a maioria dos crentes das religiões fundadas na revelação bíblica acredita ser superior aos homens – que serve como ajudante ou mensageiro de Deus. Na iconografia comum, os anjos geralmente têm asas brancas de pássaro e uma auréola. São donos de uma beleza delicada e de um forte brilho, por serem constituídos de energia, e por vezes são representados como uma criança, por terem inocência e virtude. Possuem influência sobre todo o plano orgânico e elementar, sendo assim eles têm como uma de suas missões ajudarem a humanidade em seu processo de evolução.
A palavra anjo deriva do latim, ângelus, e do grego, ângelus (γγελος), com o significado de mensageiro.
Segundo a Tradição Católica, são citados apenas três Arcanjos dos quais se saberia o nome: São Miguel (Quem como Deus), São Rafael (Deus Cura), e São Gabriel (Enviado de Deus). Os demais seriam invenções do povo, bem ou mal intencionado.
Afirma ainda que os Anjos não possuem maneiras de conhecer o futuro, possuindo sim uma inteligência muito mais desenvolvida que a nossa, podendo “prever” eventos que fisicamente poderão acontecer, visto que conhecem com precisão todas as regras físicas, como gravidade, densidade, velocidade etc.
Dentro do Cristianismo Esotérico e da Cabala, são chamados de “anjos” os espíritos num grau de evolução imediatamente superior ao do homem e imediatamente inferior ao dos arcanjos.”

E sempre, sempre, anjos descritos e esboçados ou pintados com asas. Anjos teriam o poder de voar... Todos os seres vivos que voam, têm peso, e as asas se destinam a “aliviar” o peso, de forma a que não caiam como pedras, sustentando-se no ar, flutuando no ar, locomovendo-se no ar.

Mas anjos não têm peso, por não serem seres materiais. Nem precisariam de asas para flutuar, locomoverem-se no espaço. Imagino também que, estando eu no fundo do oceano, a bordo de um submarino e precisando de ajuda do meu anjo da guarda, não seria possível a um anjo descer até o submarino usando suas asas. O anjo teria que transformar suas asas em barbatanas e seus pulmões em guelras... Porque não desenham anjos com barbatanas?

Com os progressos da tecnologia, e podendo o homem habitar até o espaço sideral, precisamos rever a descrição dos anjos e passarmos a defini-los como seres “anfíbios”.

Alguns anjos têm a forma de crianças aladas, outras de adultos. Eu prefiro anjas peitudas, vestidas sumariamente ou até nuas, com meias arrastão, bundinhas arrebitadas, chamando-me com olhares lânguidos, boquinha em “o” com batom cor de cereja...

Rui Rodrigues



[1] texto entre aspas "...."  foi extraído do site http://anjosdedeus.wordpress.com/significado-de-anjos/)

domingo, 22 de janeiro de 2012

Chega de hipocrisia política - Basta !



Somos um lindo, belo, inteligente, empreendedor, progressista e rico País. Um país de negros, construído com mão de obra escrava negra e índia durante séculos, enquanto os senhores que tinham dinheiro – e, portanto, podiam empreender, fundar empresas, possuir terras a perder de vista– se deliciavam com os progressos da civilização ao poder da chibata, mandando seus filhos não bastardos para estudar na Europa. Possuíam as terras com o mesmo fervor animal com que possuíam as belas moças da senzala. Invariavelmente, estas carregavam seus filhos bastardos e mulatos como podiam. A hipocrisia não reconhecia o trabalhador negro como cidadão, os senhores das senzalas não reconheciam os filhos bastardos, os políticos governavam para os senhores das senzalas. Definitivamente, o governo não representava a sociedade e isso era tido como normal: Os brancos dominavam.


O tempo passou, e embora se constate que os governos – em geral - não representam as populações, ainda que sob o nome de democracia representativa, assistimos à continuação da hipocrisia como mola perversa da política, quer o governo seja socialista, republicano, democrata ou tenha qualquer outro nome pomposo e ilusório de forma de governo: o povo, a população, não está devidamente representada nos governos.Temos uma população constituída por cerca de 53,8% de brancos, 45,3% de pardos e negros, 0,5% de amarelos, com aproximadamente cinqüenta por cento de homens e 50% de mulheres. Nosso Senado, nossas câmaras de vereadores e de deputados não expressam esta realidade: a maioria é essencialmente de brancos, homens.  

Como sabemos vereadores, deputados e senadores, votam de acordo com as determinações dos respectivos partidos políticos, mas como estes são constituídos etnicamente? Além disso, quem representa então as etnias que constituem a nação brasileira?

Precisamos de menos hipocrisia para que nos possamos sentir representados, e fica a pergunta: A quem ou o que representam esses senhores brancos no governo?


Rui Rodrigues

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Vérsico Um




Vérsico Um


Olhei teus olhos límpidos, lânguidos, úmidos,
Olhavas-me no mais fundo de minha alma,
Buscavas sermos um em mim,
Como esperavas que fossemos um em ti,
As mãos suaves percorrendo nossos corpos,
Buscando as nossas intimidades para dar prazer,
Para sentir o que se sente quando se ama, se deseja, se quer.

Teu corpo ficou suave, mole, entregue, como se não houvesse amanhã,
Tuas pernas se abriram, teu corpo era uma viagem,
Tua boca sedenta era demasiado pequena para a tua ânsia,
Teu corpo tremia, tua pele colava-se à minha,
Éramos um só, um prazer só, um gozo só, um suor só, um tremor só.

Mas isso foi há muito tempo.

Depois disso, começaste a comparar os meus olhos com outros olhos,
Minha alma com outras almas,
Minhas mãos com outras mãos,
Minhas intimidades com outras intimidades
Meus desejos com outros desejos, com outros amores, com outros quereres,

Tua carne ficou endurecida pela tensão do haver um amanhã,
Tuas pernas abertas queriam fechar-se como num fim de viagem,
Tua boca já seca era demasiado grande para quem não tem ânsia de sede,
Teu corpo estava rígido em tua pele seca,
Não éramos um só, porque muitos estavam presentes.

Então, quando o camareiro do tempo bateu na porta e disse: O tempo acabou!
Arrumamos os nossos sacos das más lembranças que levamos para o amanhã.

Deixamos as boas lembranças no Motel do tempo, esquecidas, para não haver arrependimentos.

Rui Rodrigues

Ensaio sobre a Esperança



sobre a esperança

Para uma criança de 10 anos no inicio da década de cinqüenta, em Lisboa, uma viagem de ônibus de pouco mais de quarenta km, contando a volta, era uma aventura de descobrimentos de paisagens e coisas jamais vistas, apreciadas, como um copo de café com leite em Caneças [1]com queijo saloio[2] e pão de casca quente e quebradiça. Era uma verdadeira aventura, principalmente na saída, quando tudo poderia acontecer e a expectativa era muito grande. Invariavelmente, fui me habituando à monotonia das viagens de ônibus normais em que nada acontecia. Nenhum empecilho, nenhuma dificuldade, nem um simples desastre sem feridos. Era tudo normal, seguro, sem aventura alguma. Aventura era coisa das revistas em quadrinhos e dos filmes de desenhos animados. Revistas havia muitas. Televisão sabia-se que já existia no Reino Unido e nos EUA, mas ainda não em muitos países do mundo. Os desenhos animados, somente podiam ser vistos em cinemas, em “Cinemascope” a ultima novidade colorida das telas de cinema.  

Foi assim que percebi o que nos movimenta no mundo: a esperança em que algo aconteça ou vá acontecer no dia seguinte. Quem não esperar nada de diferente ou gostoso para o dia seguinte, está morto ou em franca depressão. Pelo menos temporariamente, até que tenha esperança de algo de bom aconteça no dia seguinte, como por exemplo, uma viagem de ônibus de cerca de quarenta km, a lugar desconhecido, incluindo a volta. Na ida se vê a paisagem de um lado da estrada, e na volta o outro (há que tomar cuidado para não voltar olhando o mesmo lado da paisagem de ida). Porém, em nossa vida, fazemos uma viagem apenas de ida. Nascemos para uma grande viagem, durante a qual só vemos um lado da estrada. O outro permanecerá oculto para todo o sempre, porque não há viagem de volta, pelo menos, de forma consciente. Em particular, se apostar minha vida na esperança de um dia poder fazer a viagem de volta de forma consciente, estarei perdendo todas as perspectivas desta minha viagem, porque não há notícia de quem tenha feito a viagem de volta. Minhas esperanças devem, portanto, concentrar-se nesta minha viagem única, tentando torná-la o mais agradável que me for possível. Se, para tornar a vida de outrem agradável, tiver que transformar a minha vida num inferno, terei um grande e grave problema: doar o que Deus me confiou apenas para mim, de forma realmente egoísta. Evidentemente que tenho consciência de que devo – e tenho a obrigação – de tornar a vida daqueles que me cercam o mais feliz que me seja possível, mas não a ponto de tornar-me infeliz. Se o fizesse, seria um suicídio de minha felicidade, anulação dos princípios da vida, coisa que até qualquer religião proíbe a seus fiéis, muitos deles de fidelidade questionável.

Sem esperança, não vamos a lugar algum. Cruzamos os braços e esperamos a morte chegar, deprimidos, sem sabermos para onde ir, o que fazer. Sabendo disso, os governantes, ao longo da história, têm nos brindado com as melhores e mais atraentes doses das mais diversas esperanças, uma delas, a mais “gratificante”, a de que podemos obter um lugar no “céu”, lugar paradisíaco, sem problemas, apenas com tudo o que almejamos ter na vida e não conseguimos obter. Faço-me sempre a mesma pergunta: O que pode almejar no céu, quem aqui na terra já teve de tudo? Obtenho sempre a mesma resposta: Provavelmente desejará o inferno, na esperança de que possa ter algo que ainda não teve. Para esses, sua esperança reside em que, ao final desta viagem, se depare com um inferno cheio de novidades.

O que será para cada um de nós, leitores, ao final desta vida?

Céu, inferno, ou purgatório, onde purgamos não sabemos o quê, porque razão, para que fim, sem ao menos sabermos o que tem no céu, no inferno ou no purgatório...

Creio que precisamos urgentemente rever as nossas esperanças nesta viagem na vida sem bilhete que nos garanta a viagem de retorno. Haverá alguma esperança de que possamos entender que esta vida é a única oportunidade que temos de estarmos conscientes, e de que não podemos fazer absolutamente nada de que possamos nos arrepender? E que se o fizermos, devemos compensar quem prejudicamos?

Rui Rodrigues



[1] Caneças é uma vila nos arredores de Lisboa.
[2] Saloio é sinônimo de campestre, trabalhador do campo.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Um dia!

Um dia cansativo, pesado.
Chuvoso, escuro.
O sorriso da mulher amada,
Uma música bonita.
Um gesto, um aceno.
Um beijo.

Como as coisas mudam!
Como as cores surgem.

Ah, um dia!
Um dia em que a mente do poeta viajou.
Andou nas nuvens, no passado.

Nele, os erros, os enganos, 
No beijo da mulher amada,
A luz que ilumina um dia cinzento do poeta.

Um abraço, Paulo!

Crônicas do Pontal do Peró - Comandantes de naus!


Crônicas do Pontal do Peró

(Comandantes de naus, navios e outros artefatos náuticos que por um segundo de arco num segundo de tempo, se afastam da lógica para mostrar alguma coisa sem muita lógica)


O circulo tem 360 graus, cada grau dividido em minutos e segundos de grau. Os rumos da navegação terrestre, naval ou aérea, são expressos desta forma. Uma mudança de rumo de poucos segundos de grau, mantida durante uma hora, pode resultar em distâncias de quilômetros do alvo que se pretendia atingir.  Isto tem sido causa de muitos desastres na história da navegação, em qualquer lugar do mundo, em qualquer época da história das civilizações. O tempo também se mede em minutos e segundos, mas no sistema sexagesimal, isto é, cada minuto tem sessenta segundos, mas para não caírem numa solução de continuidade, resolveram que os segundos do tempo deveriam ser medidos em centésimos, milésimos, milionésimos, misturando dois sistemas de medição: o sexagesimal e o decimal... Não os culpo por isso, embora eu ache que deveria haver coerência. O dia deveria ter dez horas, divididas em cem minutos e cada minuto em cem segundos. Cada segundo em tantos “... lhonésimos” quantos quiséssemos... A vida nossa de cada dia seria muito diferente da que temos hoje, e a garotada que começa a aprender lógica nas escolas, não ficaria engasgada com estas incoerências... Ainda hoje nos perdemos por completo com o sistema de subdivisões incoerentes da Libra Esterlina do Reino Unido pela mesma absoluta razão. Tenho certeza absoluta que o Banco da Inglaterra não vai mudar as subdivisões da libra tão cedo, assim como ninguém irá mudar a hora para conter cem minutos e cada minuto cem segundos. Há muitas coisas neste mundo que ninguém está disposto a mudar pelo simples motivo de que não há uma aparente “boa” razão para mudar.

Mas o que isto tem a haver com o Peró?

Tem muito...

Lá pelo ano de 1.500, um comandante de navio saiu da rota, equivocou-se e descobriu um continente imenso: o Brasil, que depois de ser dividido entre Portugal e Espanha pelo Tratado de Tordesilhas, com a benção do Papa, passou a chamar-se América do Sul, por causa de um imediato chamado Américo Vespúcio que veio com a frota de 1501 e fundou uma feitoria aqui em Cabo Frio. Os comandantes, como se pode ver, equivocam-se muito nas rotas, descobrem terras ou pedras, mas não emprestam seu nome para os lugares que descobriram. Nem o famoso Cristóvão Colombo, mas este ainda teve um pouco de sorte: um país, a Colômbia, honrou-lhe o nome. Hoje seria inimaginável chamar os Estados Unidos da América do Norte, de Estados Unidos da Cristóvânia do Norte. Seria um absurdo, que jamais ocorrerá mesmo que fosse por questões de reposição da justiça: beneficiar a memória do nome do comandante descobridor em detrimento do nome do obscuro imediato que só recebia ordens do comandante.

Naquela época não havia comunicação por rádio, e usar pombos correio para distâncias tão grandes, era inviável. Uma carta mandada do Brasil para a Europa demorava aproximadamente seis meses, e a resposta para chegar, outros seis... Mas se já houvesse esse tipo de comunicação – poderia ser um celular - talvez pudessem ter gravado uma conversa como esta, referente ao desvio de rumo de Pedro Álvares Cabral, o comandante da frota que ia para a Índia, do outro lado do globo e se desviou tanto que deu com os botes nas águas calmas e lânguidas – até hoje – das baianas terras de Baía Cabrália:

(Porto de Lisboa- Centro de Comando da Expedição para a Índia- Comandante João Garfo)

Comandante João Garfo: - Está? É o senhor comandante Cabral?

Comandante Cabral – Sim, sou eu mesmo. Em que posso servi-lo?

Comandante João Garfo – Desejo saber se já chegou ao Cabo da Boa Esperança, a caminho das Índias...

Comandante Cabral – Não, não... Muito longe disso, um oceano inteiro de largura longe disso. Estou na Terra dos Papagaios, também chamada de Vera Cruz, ou do Pau Brasil...

Comandante João Garfo – Advirto Vossa Excelência que esta conversa está sendo gravada. Volte logo para o caminho das Índias. O senhor desviou-se muito da rota. Se houver algum desastre a culpa é sua.

Comandante Cabral- Ora a culpa é minha!... Onde já se viu uma coisa dessas? Porque não me avisaram que minha frota se estava desviando da rota? Só agora que cheguei ao Brasil é que me avisam? Isso não é justo.

Comandante João Garfo – Fica Vossa Senhoria avisada que deve voltar agora mesmo para a rota das Índias porque se não o fizer, vou fazer da sua vida um inferno. Será excomungado e sua Alteza Real, o Rei, o desterrará para a sua terra natal onde será esquecido. Volte para a R-O-T-A das Í-N-D-I-A-S já. Porra! Está me desobedecendo?

Comandante Cabral – Não. Não estou desobedecendo, mas há um oceano muito grande pela frente até chegar ao Cabo da Boa Esperança e depois ainda temos o Oceano Índico para atravessar. Não vou chegar a tempo de assistir aos jogos olímpicos de Calcutá...

Comandante João Garfo – Como castigo por sua falta de atenção aos rumos, comandante Cabral, e sua relutância em retomar o caminho das Índias, o Continente se chamará América do Sul. América, em homenagem ao seu estúpido imediato Américo Vespúcio que nunca teve o mérito de ser convidado para comandante de frota alguma. Nem de venezianos, nem de portugueses, espanhóis ou mesmo ingleses, franceses ou holandeses.

Como sabemos, Cabral retomou a rota das Índias, quando lhe deu na telha e não quando o comandante João Garfo o intimou. Talvez como vingança pelo esporro e pela desconsideração sobre o uso de seu nome para identificar o continente, somente seis das treze naus chegaram às Índias. As sete naus afundaram por tempestades, fogo a bordo, rochedos pelo caminho...

Recentemente, agora em janeiro de 2012, um italiano ao navegar no Mediterrâneo comandando o “Costa Concórdia”, navio de turismo, deu-se conta da situação econômica da Itália, do congelamento dos salários, da redução dos benefícios de aposentadoria, mas os preços das viagens não baixaram e os navios continuavam cheios, abarrotados de turistas. Perguntou-se muitas vezes onde estava essa tal de crise que ele não via nenhuma, mas por conta da auto-sugestão coletiva de que havia crise, os cidadãos italianos estavam pagando por um pato fantasma: o pato dos homens do governo que exauriram as reservas italianas.  Perguntou-se se Silvio Berlusconi teria ficado menos ou mais rico com a tal crise, mas não teve tempo para obter a resposta. O comandante sentiu que estava sendo enganado, e pensava exatamente nisso quando o Costa Concórdia bateu numas rochas e afundou pela metade. Para o comandante, embora talvez não tenha sido a intenção, o barco ficou nas fotografias como o “seu” monumento resposta popular á crise internacional das finanças.

Ao caminhar pelas areias da praia do Peró, nesta manhã, fiquei com a certeza absoluta de que não se pode brincar muito com comandante quando a administração sai do rumo...

Rui Rodrigues

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terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Crônicas do Pontal do Peró - Sentidos



CRÔNICAS DO PONTAL DO PERÓ

(A direção e a intensidade do sentido)


Fui um bom garoto, um bom adolescente, um bom cidadão, e vivo no Pontal do Peró. Nem sempre, mas quase sempre. Quando preciso de um pouco de inferno, em maior ou menor grau, saio daqui e vou a Búzios, Cabo Frio, Rio de Janeiro. Mas como tudo é relativo, há vários graus de inferno, o norte não dista tanto do sul, a esquerda por vezes se confunde com a direita ali pelo centro, e a diferença entre céu e inferno não é tão gritante para quem está tão longe de um quanto do outro.

A praia é grande, tem cerca de sete km de extensão, e se estende da praia das Conchas ao Pontal da praia do Peró. Dunas de um lado, mar do outro, ora à esquerda umas, á direita o outro, dependendo pra onde se vai. Muitas gentes que visitam ou vivem num destes lugares, nunca visitaram os outros, e já se vão muitos anos de vida por aqui, mas as notícias chegam de todas as partes do mundo, de forma virtual. Notícias verdadeiras chegam de forma virtual ao Pontal do Peró. Amor virtual pode ser verdadeiro no Pontal ou qualquer outro lugar do mundo. A diferença entre a virtualidade e o real, depende apenas da forma e da intensidade com que se sentem as coisas que nos rodeiam e nos atingem como raios iônicos, materializando-se num fenômeno incontrolável a que chamamos tempo. O tempo é intocável, indefinido, mas existe em qualquer lugar imaginável ou inimaginável, á esquerda, á direita, no céu, no inferno, em cima, embaixo, na praia das conchas, e ao longo dela, até o Pontal do Peró. Não há mau tempo. Há tempo apenas, puro, simples, indecifrável, sem peso, velocidade determinável. Nossa contagem dos segundos é pura convenção, uma forma de medir. Em outros sistemas solares, um minuto não é igual a minuto igual ao nosso, a não ser se medido pelo césio, mas na vida real, ninguém tem a mínima consciência disso. Provavelmente nem terá a mesma importância que lhe damos.

Os animais, autóctones, donos do lugar, transitam entre as Dunas e a reserva de matas virgens defloradas pela ambição humana, pelo progresso com desordem como é natural e intrínseco aos desejos de felicidade dos humanos. Nem todos os animais transitam pelas matas. Alguns já foram extintos, como as onças, que já não vêm beber água junto às pedras do Pontal.

O tempo é como as ondas do mar que por vezes são mais fortes, mais altas, mas rápidas, outras vezes parece que nem existem. Movemo-nos em vários mares, em várias águas, numa vida que é particular a cada um, e da qual ninguém mais sabe quase nada, apenas que existimos e que somos alguma coisa parecida com o que pensam que somos julgando por meia dúzia de atos que nos viram cometer e pelos quais nos julgam. Impossível verem ou saberem de todos os nossos atos, e no entanto, tentam avalizar-nos todas as vezes que nos encontram, reavivando a memória, tentando lembrar-se de atos passados, imagens que guardaram em arquivos perecíveis que, eles mesmos, se distorcem ao longo desse mesmo tempo em que nos movemos. Perdemos então a noção do que é virtual e do que é real, exceto em relação a nós mesmos, a quem conhecemos muito bem, porque dominamos todos os nossos atos desde o primeiro instante em que nos olhamos e sentimos que existíamos. Desde então, temos mantido um “eu” de que gostamos e que chegamos a admirar. Basta olhar para o passado, e do quanto nos arrependemos, ou não, do que fizemos. Somos quase que os donos do nosso tempo. A casa pode ser nossa por mais ou menos tempo, e o carro, e a roupa, e os amigos, mas só o tempo é realmente nosso até que ele mesmo se separa de nós. Alguns chamam a isso de “alma” ou “espírito”. Eu chamo de tempo. Quando o tempo nos deixa – ou nós deixamos o tempo, que na teoria da relatividade não importa o que deixa o quê – tudo se apaga, e somente durante algum tempo ainda perduramos no imaginário – virtual – de alguns que se dignam recordar-nos, até que mais ninguém se lembrará. Nomes num livro de história, mesmo que com algumas imagens, não definem o que fomos, e sempre estará sujeito á limitação do pouco que conheceram de nossos atos. Por isso não podem julgar-nos em nenhuma instância ou em alguma circunstância. O tribunal de Osíris já foi fechado, e as almas, ou “kas”, já não são pesadas em função do que fizemos de coração ou de imaginação.

Não sei se as ondas do mar estavam fortes agora á noite, nem se vinham com velocidade ou apenas murmuravam sussurros nas areias da praia. As noticias da Europa ainda marolam na crise originada nos EUA e como qualquer tsunami, chegarão à América do Sul. Dei-me conta de que continuo sendo o bom garoto que foi um bom adolescente, um bom cidadão, e que merecia algo diferente de ontem: entrei na Internet mais uma vez, apenas para apanhar uma receita de molho branco com noz moscada, creme de leite, queijo ralado e pimenta do reino que não por acaso tinha em minha despensa. Espero uma amiga de visita para quarta-feira e sei que aprecia um bom prato. Assim, resolvi adiantar a receita, hoje, terça-feira, para aproveitar todo o potencial de cozinhar com vontade de agradar. Cortei batatas às rodelas grossas e coloquei no fundo de um pirex. Por cima, coloquei lascas gordas de bacalhau que previamente cozi. Por cima de tudo, um refogado de alho e cebola em azeite virgem. Por cima de tudo, o molho branco e ovos cozidos em rodelas, que espalhei aleatoriamente. Levei ao forno por vinte minutos. O prato será servido como surpresa, exceto por um pequeno pedaço que faltará, mas não numa amizade á qual não falta pedaço algum. Nada é perfeito, mas ficou muito bom, sem falsa modéstia. Brindei sozinho hoje, esperando o dia de amanhã, com um vinho tinto, forte e aromático como o bacalhau, forte como as ondas fortes do mar forte, como as esquerdas quando lutam contra as direitas, como os céus quando lutam contra os infernos.

Ainda fico impressionado com algumas coisas que ainda descubro da vida, e da mesma forma me impressiono como levamos tanto tempo para perceber como é simples e fácil ser-se feliz. Infelizmente também me impressiono pelo modo fácil com que nos deixamos levar por ondas de moda, de princípios, de lastimáveis princípios que, em nome de falsos objetivos, nos encobrem a nossa felicidade aos nossos próprios olhos e nos obrigam a passar grande tempo de nossa vida em trajetória errônea em busca de uma pretensa felicidade que alguns de nós jamais encontramos por milênios que pudéssemos viver.

Quem fez este universo o fez com leis fáceis e simples, belas, simétricas ou quase, perfeitamente estáveis, sem nada que complique.

E quando se descobre o véu do que nos é encoberto, teimam em desprezar e bloqueiam a constatação para que nada se altere no que pensam ser o ambiente estável da vida que lhes dá esperança eterna de felicidade. Só esperança.


Rui Rodrigues